São cinco horas da manhã.
Em algum lugar da cidade um rádio-relógio toca insistentemente e seu dono aperta o botão da soneca, já sabendo que irá se atrasar para o trabalho naquele dia. Num quintal grande, um desses poucos que ainda resta no meio da selva de concreto, um galo canta adiantado. Não amanheceu ainda. Mas parece que não é noite mais.
Uma moto passa quieta pela rua. O mais quieta que uma moto pode ser. Seu motorista ignora o céu escuro. Mas o barulho não é ignorado por mim.
Ouço o som da madrugada.
Quieto. Barulhento.
A maioria das pessoas dorme um sono profundo, prontas para acordar para outro dia de afazeres.
E eu penso. Penso sobre a vida. Sobre a minha vida e a dos outros. Penso sobre o sentido de estarmos todos aqui.
Penso sobre a morte. Esse evento inevitável a todos nós. Mas nunca penso sobre ela de forma triste. Vem como um pensamento natural. A morte sempre foi natural a mim. Como estar com fome. Uma necessidade humana. Um evento humano.
Tenho saudades. Sinto saudades de algo. Não sei exatamente do quê.
Parece não ser bem saudades. Talvez seja mais uma nostalgia.
Nostalgia do que foi, nostalgia do que não foi mas poderia ter sido.
Nostalgia do que será e nostalgia do que nunca vai ser.
Continuo pensando. Em pessoas. Que estão presentes em minha vida, que já se foram. Pessoas que não falo mais, e outras que permaneceram durante anos.
Penso em quanto a madrugada é linda. Em quanto longa é. Mas o quão rápido ela passa. Leva minhas perguntas sem responder nenhuma delas. Leva meus sentimentos sem apaziguar nenhum. Sem se importar com o dia que tenho pela frente.
Vazia, cheia de significado.